Leminskata: Apenas Isto Importa
o cristianismo nasceu
das palavras de Jesus
o zen nasceu
de um silêncio de Buda
um dia o iluminado
em lugar do sermão
apresentou aos discípulos
uma flor
sem dizer palavra
um único discípulo entendeu
mahakasyapa
primeiro patriarca do zen
a doutrina da meditação silenciosa
da concentração descontraída
da dança não dançada
da voz sem voz
da iluminação súbita
da luz interior
da superação dialética dos contrários na vida diária
“o silêncio de buda”, Paulo Leminski
Apenas Isto Importa: essa fórmula, por assim dizer, compõe os aspectos mais contundentes das sabedorias extremas, como o Advaita Vedanta – abordagem crítica dos Vedas indianos ao dualismo –, certas vertentes do budismo, do Taoísmo etc. Se tal fórmula encontra recorrência em sabedorias “orientais” – apreendendo “Oriente” enquanto uma construção “dualista” –, cabe se perguntar como a contraparte dessa construção, o “Ocidente”, apreende essa fórmula.
Do que se trata a fórmula Apenas Isto Importa? A princípio, vamos recorrer ao Advaita Vedanta, sobretudo nas concepções de dois sábios indianos do século XX que trazem passagens próximas a essa interpretação dos Vedas: Ramana e Nisargadatta. Grosso modo, só há Consciência, dela emerge a mente individual, que é atravessada por inúmeros fenômenos, em linhas gerais, as “coisas do mundo”, supostos objetos, sentimentos, espacialidades, temporalidades etc. O convite desses sábios é realizar uma autoinquirição, de modo que estejamos atentos ao fato de que tudo o que surge em nossa percepção é efêmero e se passa na Consciência, que aceita tudo sem julgar nada. Ao apreender que somos Um na Consciência, toda a separação é desmantelada, apresentando-se enquanto ilusão. A partir disso, a ilusão da mente individual enquanto algo separado da Consciência se dissolve. Nossa experiência cotidiana ganha uma nova intensidade, fazendo com que os sofrimentos, angústias oriundas dessa ilusão de separação sejam eliminados.
Cabe um alerta: a definição acima é demasiada curta e simplificadora. Há diversos textos e falas de sábios de outrora e contemporâneos que conduzem a um maior esclarecimento das peculiaridades dessa sabedoria na mente de cada um. Feito o alerta, como podemos apreender o Apenas Isto Importa a partir de nossa percepção, bem diferente da cultura indiana, ou seja, a proposta de que a única ação relevante é se apreender imanente à Consciência?
Segundo François Jullien, filósofo e sinólogo francês que morou anos na China, aprendendo o mandarim e o Taoísmo, sobretudo em seu Um sábio não tem ideia, o pensamento “ocidental” que mais se aproxima do Taoísmo – que aqui estamos aproximando levemente, ciente de várias diferenças, do Advaita Vedanta indiano – seria o estoicismo, vertente grega póstuma de seguidores da filosofia de Heráclito. Nesse sentido, as confluências seriam a impermanência ou o devir como apreensão básica da Natureza, além de uma relação não dialética do pensamento, de modo que seu processo se daria menos por um conceito levar a outro, chegando a uma conclusão, e mais no sentido de que a sabedoria se dá por uma coexistência de conceitos.
No caso específico do Advaita Vedanta, notamos – como desenvolvemos em nosso artigo com Veetshish Om, “Bento: Spinoza de iluminista à iluminado” – uma ressonância intensa com a filosofia de Spinoza, cuja ontologia pode ser apreendida como um desdobramento do estoicismo.
Se os estoicos, Spinoza e vários de seus intercessores nos fornecem inúmeros conceitos que, de fato, promovem belas confluências com saberes milenares indianos e chineses, os “ocidentais”, por outro lado, fornecem poucas pistas da prática cotidiana desses conceitos. Inexiste na filosofia grega, iluminista etc., uma prática específica como a autoinquirição ou outras meditações. Encontraremos algo parecido na Escolástica ou no esoterismo ocidental, no entanto, em ambos, a fórmula Apenas Isto Importa encontra desvios problemáticos. Na Escolástica, há uma drástica mudança no “Isto” para “Aquilo”, ou seja, a Consciência imanente a tudo deixa de ser o foco da atenção para orbitar em torno de um Deus criador transcendente. No esoterismo, dada uma enorme miríade de vertentes, nos perdemos em várias práticas que muitas vezes negligenciam o Apenas Isto Importa, em prol de predições, experiências de alteração de consciência, poderes mediúnicos etc.
Ao se perguntar onde, na experiência “ocidental”, podemos encontrar um mergulho pessoal na fórmula Apenas Isto Importa, qual resposta é a mais precisa? Tamanha radicalidade é recorrente nos que se dedicam a expressar plenamente uma poética.
Ao se ganhar mais intimidade com a Consciência e parcialmente diluir-se nela, um desdobramento natural é expressar-se em uma cadência mais poética, não necessariamente pela poesia apenas. Existem diversos autores “ocidentais” em que podemos encontrar uma ressonância com a fórmula Apenas Isto Importa, nos mais diversos campos do saber: a filosofia de Deleuze, o cinema de Bergman, na música de Leonard Cohen, a literatura de Kafka, a pintura de Van Gogh e tantos outros. Se preferimos um autor polímata, mas que sempre passa toda a sua produção por uma potente poética, é também porque ele é brasileiro, de modo que se torna ainda mais próximo de nossa experiência: o poeta curitibano Paulo Leminski.
Leminski é tratado geralmente como poeta, como fizemos acima, mas é muito mais que isso: compositor e letrista de MPB e rock, tradutor, articulista, criador de conceitos, agitador cultural (participou de várias revistas alternativas), professor disputado de cursos pré-vestibular, tendo em grande parte da sua vida trabalhado também em empresas de marketing. Ser poeta, obviamente, já é muito, no sentido que ser poeta é muito mais de escrever poesia; Leminski, como podemos observar nas biografias, depoimentos e vídeos, vivia em estado poético todo o tempo. No entanto, Leminski foi muito além, mas sempre com a poética passando por todos os aspectos, para além do bem e do mal. Se usarmos os critérios estabelecidos por Peter Burke em O polímata – ter interesse em vários campos do saber, incluídos os saberes populares, ter um sentido de urgência, ser poliglota, desejar estar próximos de bibliotecas, ser brincante – veremos claramente que Leminski é um exemplo perfeito de polímata.
O fato de Leminski ser canonicamente chamado de “o melhor poeta de sua geração”, mantendo-o atrelado à poesia marginal dos anos setenta no Brasil, turva o fato dele ser um legítimo pensador, reconhecido pelos seus interlocutores por sua grande erudição, eloquência e originalidade.
O Polaco – como era chamado, dado sua genealogia paterna -, de fato, possuía algumas características atreladas à poesia marginal: a concisão, o humor, o uso de gírias etc. Mas é preciso qualificar sua concisão. Leminski é muito lembrado enquanto um poliglota, tendo estudado Bashô, o mestre dos haicais, no original. Na biografia que ele escreveu sobre Bashô, há até análises sobre a estrutura gramática do japonês. A concisão dos poemas de Leminski trazia a influência de toda uma escola japonesa dos haicais, sendo que ele estaria consciente dessa influência na história da poesia brasileira, citando em seu artigo “Bonsai: Niponização e miniaturização da poesia brasileira” os poetas Guilherme de Almeida, Oswald de Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Murilo Mendes, Millôr Fernandes etc., chegando em uma influência relativa, algo involuntário, dos poetas de sua geração.
A relação de Leminski com o “Oriente” vai mundo além dos haicais: tinha vívido interesse pelo zen-budismo, pelos samurais, pela obra de Sun Tzu, além, claro, da prática do judô.
Já em seu artigo “Central elétrica: projeto para texto em progresso”, Leminski defendia a necessidade de uma “Itaipu poética”, no sentido da produção artística erudita inspirar e galvanizar a arte de produtores mais populares, elevando o nível de toda a cultura brasileira. Além de teorizar, ele realizou a Itaipu poética: Leminski produziu um dos maiores – e herméticos – textos de prosa poética escritos no país, Catatau, mas também escreveu letras para vários nomes da MPB, como Caetano Veloso, Arnaldo Antunes, Moraes Moreira, Guilherme Arantes, Vitor Ramil etc., passando também por algumas histórias em quadrinhos eróticas, com elementos de terror e história infantil, culminado na publicação póstuma de sua Toda poesia, tornando-se então um best-seller nacional.
Catatau é um romance experimental escrito por ele, durante oito anos, desdobrando seu conto “Descartes com lentes”. Ele se instala em agenciamento da experimentação literária brasileira de Os sertões de Euclides da Cunha, passando por Grandes sertões: veredas de Guimarães Rosa e Galáxias de Haroldo de Campos, a quem, entre outros, o livro é dedicado. Catatau já era um mito interno no meio literário mesmo antes de sua produção, com trechos publicados em jornais e revistas mesmo durante sua escrita, como conta Toninho Vaz na biografia O bandido que sabia latim (autodenominação de Leminski). A narrativa de Catatau orbita em torno de uma suposta vinda do filósofo René Descartes ao Brasil pela companhia de Maurício de Nassau. Ao chegar em Pernambuco, Descartes fuma um baseado em entra numa egotrip.
Se em Galáxias, na sua página final, escreve-se “esse tudo vai nessa foz do livro nessa voz e nesse vós do livro que saltimboca e desemboca e pororoca nesse fim de rota”, em Catatau, lê-se: “Um, dois, trans…! Toco o pau no Ser: incorpora meus golpes à sinfonia dos seus contrastes, que inclui no mesmo tópico – os inventários longínquos, as desavenças dos sinópticos, os trancos que vem aos barnabés de barrancos, as pororocas!”. A pororoca era, pra Leminski, a “ponte arco-íris”, que conflui as correntes paulistas e baianas, assim como a complementariedade móvel taoísta de Yin e Yang. Em carta a Régis Bonvicino, Leminski escreve acerca da pororoca: “PARA FRENTE NA PRÓXIMA ESPIRAL!”, ainda que termine a mesma carta com “prudência vem”.
Em Metaformose: uma viagem pelo imaginário grego, Leminski vai reler Ovídio numa prosa que ressoa com Catatau. O tema é o devir, (ainda que termo não seja utilizado no livro) e o caos. Em Metaformose, em que se assume o “narro, logo existo”, já que na fábula “pensa-se o impensável” na “multiplicidade do real”, vários trechos entram em ressonância com a filosofia da diferença, ainda que não haja registro de que Leminski tenha lido Deleuze e seus principais intercessores: “quase ser é melhor que ser” e “mito (fábula), conceito e número: esses os três instrumentos com que a mente humana procura colocar ordem no caos desconexo dos fenômenos”. Tendo Metaformose terminado sua escritura em 87, percebe-se que Leminski prefigurara, nessa última frase citada, as caoides de Deleuze e Guattari presentes em O que é a filosofia? em cinco anos. Com as caoides, os franceses conceituam as filhas do caos: a arte (que emoldura o caos com afectos e perceptos), a filosofia (que explica o caos por conceitos) e a ciência (que explora o caos por funções).
Em seu “Minifesto”, Leminski traz contribuições importantes para apreendermos sua concepção da poética. No item 4, ele diz: “O grau de competência nada tem que ver com domínio artesanal do(s) código(s). Tem que ver com sua superação”. No item 5, o Polaco vai apreender com precisão o problema das amarras acadêmicas contemporâneas, tão afeitas ao politicamente correto, além de cultivarem ingenuamente, ou não, um país polarizado: “Critérios outros (postura social, justeza ideológica, boas intenções) são demagógicos e só servem para encobrir o verdadeiro problema da criação (= produção de informação nova) e conduzem, natural e logica-mente ao academicismo”.
Em seu contundente depoimento “Sobre Poesia e Conto”, Leminski, ao afirmar que o “excessivo amor aos símbolos é amor à morte. Prefiro a vida, esse signo sempre incompleto”, prefigura as teses mais recentes do antropólogo Tim Ingold, que em seu Imagining for Real, com argumentos semelhantes, sempre crítico ao estruturalismo e seus desdobramentos, confessa-se um semiófobo em prol de uma topofilia.
Leminski não tinha carteira de identidade, conta em banco, não tomava banho regularmente, não tratava dos dentes e evitava médicos o máximo possível; afinal, Apenas Isto Importa. Domingos Pellegrini, em seu Minhas memórias de Leminski, conta que o Polaco dizia, na surdina: “quem é anarquista mesmo, nem fala que é!”.
Como esse zen-anarquista então dedica-se a uma biografia de Trótski? Se, de um lado, Leminski admirava o interesse de Trotski pelas artes – incluindo a arte da guerra – e sua capacidade de inspirar multidões, levando-as à revolução, de outro, o biógrafo é enfático ao afirmar que a Revolução Russa tornou medíocre a arte de sua época. Segundo Leminski, os grandes artistas russos que aderiram à Revolução – Maiakóvski, Eisenstein, Chagall, Malevich, Stravinsky, Nijinski, Kandinski etc. – tiveram sua formação artística sob o final do czarismo: “A revolução devorou seus filhos mais talentosos (…) a inovação artística se dá muito bem nas temperaturas revolucionárias. Mas fenece quando os regimes se consolidam. (…) Em setenta anos de Revolução, a URSS não produziu um só artista realmente inovador”. Em seu artigo “Corpo não mente”, Leminski ainda iria produzir mais uma ideia original acerca do tema: “Quem não vê que a dicotomia mente/corpo é uma projeção e uma decorrência da divisão do trabalho, a divisão interiorizada em nós? A mente é uma metáfora da classe dirigente servida pelo corpo”.
Toda essa intensidade de produção, focada na escritura e numa vida poética – Apenas Isto Importa – teve seu preço. Leminski desenvolveu alcoolismo e, como consequência, uma cirrose, que veio a ser o motivo de sua morte prematura aos 44 anos. Seus versos, mais acessíveis que o restante de sua obra, obnubilou o restante de sua produção, rendendo uma fortuna crítica limitada diante de tamanha originalidade e contundência.
Como a fórmula Apenas Isto Importa pode nos conduzir também a uma maior prudência? Deleuze e Guattari, em seu famoso platô “Como criar para si um Corpo sem Órgãos?”, vão, de um lado, convidar a ganhar tamanha intensidade que se possa atingir a substância spinozista ou o plano de imanência: o zero positivo, o estranho quase nada que é algo, cujo limite no impensável, para além da conceituação filosófica, o caos, ressoa com a Consciência do Advaita Vedanta; de outro, vão acrescentar à pergunta do platô, a questão de não cair em um regime de abolição, ou seja, como experimentar com prudência, de modo que não haja grandes prejuízos para o cuidado de si, ou mesmo a morte?
Os desdobramentos a esse convite à prudência são vários, que vão desde o “ficar bêbado com o copo d’água” de Henry Miller à sofisticação da intuição, que nada mais é que o ganho gradual de intimidade com a Consciência. No caso “ocidental”, cabe trazer o final de As duas fontes da moral e da religião de Bergson, em que o filósofo mostra a importância da alegria em detrimento do prazer. Sem cair em um moralismo conservador, o que o filósofo propõe é se ater mais à intuição e à abertura cósmica que ela proporciona do que o imediatismo das impregnações culturais que tende a condicionar o desejo. Com esse cuidado, podemos operar um habitar ao longo do “Oriente” – Apenas Isto Importa: a Consciência e sua contemplação – e “Ocidente” – Apenas Isto Importa: a diversão. Ressoando de modo mais preciso com as palavras finais de Leminski em seu artigo “Teses, tesões”: “Espero que todos se divirtam. Não há muito mais a fazer neste mundo”. Que tal diversão seja com alegria, intuição, precisão e poética. A intuição – quando experimentada em um extremo em que se vislumbra ou, mais amplamente, se modula- até uma adimensionalidade, ou seja, na Consciência – se expressa naturalmente em uma poética.
Na literatura brasileira, temos o caso de Lourenço Mutarelli, que, ao beber e fumar, junto com remédios e passar por uma experiência de morte que durou longos minutos após um infarte, declara, numa entrevista à revista Quatro Cinco Um, no. 61: “O que venho buscando é delicadeza”.
Como a delicadeza pode se instaurar na fórmula Apenas Isto Importa, de modo a criar um Corpo sem Órgãos sem cair no regime de abolição? Se tal fórmula, na ética da imperturbabilidade dos indianos, gera no “Ocidente” certo niilismo, mesmo que inicial, ou mesmo certo tédio, como operar nessa fórmula confluindo as mais potentes vibrações da sabedoria indiana, da filosofia europeia e da poética brasileira?
Ana Martins Marques, poeta mineira contemporânea, vai trazer novos ventos à poesia, num estranho misto de poética contundente e delicada. Silêncio e insônia se encontram em seu “Poema com ponto cego”: “Não me deixa dormir o ruído que faz à noite o silêncio aderindo às coisas todas”. O silêncio ecoa em outros de seus poemas, como em “Meu amigo”: “às vezes me ocorre encontrar uma palavra / apenas quando a encontro / ela se parece com um buraco / cheio de silêncio”.
Se Leminski ressoa, involuntário, com a filosofia de Bergson, ao dizer “durar, o maior dos milagres”, Ana coexiste em “História”:
Tenho 39 anos.
Meus dentes têm cerca de 7 anos a menos.
Meus seios têm cerca de 12 anos a menos.
Bem mais recentes são meus cabelos
e minhas unhas.
Pela manhã como um pão.
Ele tem uma história de 2 dias.
Ao sair do meu apartamento,
que tem cerca de 40 anos,
vestindo uma calça jeans de 4 anos
e uma camiseta de não mais do que 3,
troco com meu vizinho
palavras
de cerca de 800 anos
e piso sem querer numa poça
com 2 horas de história
desfazendo
uma imagem
que viveu
alguns segundos.
A poeta mineira ainda traz mais uma lição: o desejo de fumar é expresso na poética, na parte final de seu Risque esta palavra, justamente chamado “Parar de fumar”: “O que fazer agora / com as mãos / cegas? / o cigarro é parente do lápis / eram, afinal, gestos para nada / como na dança”. Não sem afirmar: “O mais belo poema / da língua (já se disse) é: pode me emprestar / o fogo?”.
Ao transduzir – não confundir com “sublimar”, estamos falando de modulações, pensando com Simondon – tabagismo em poética, Ana Martins Marques nos empresta o fogo da bruxaria poética, de modo a criar um Corpo sem Órgãos com a prudência minimamente necessária. Ao escrever aquele poema, o corpo incandescente se instaura em alguma saúde. A lemniscata ígnea abre-se aos devires, deixando de repetir em si mesma o Apenas Isto Importa trágico ao “Ocidente”. Aqui e agora, Apenas Isto Importa: o fogo poético da Consciência aquece, sem queimar até a sua finitude. Ana diria, em “O encontro”: “privar-se de alguma coisa / também tem seu perfume e sua energia”, mas acrescenta, em “Lugar para pensar”: “gosto de pensar que o pensamento / é um inquilino incendiário”. Heráclito, em algum deslugar, afirmaria “o fogo, sobrevindo, há de distinguir e reunir todas as coisas”. Percebo Leminski rir mais uma vez, concordando, não apenas com Heráclito e Ana, mas também com Alfred Whitehead e Gonçalo M. Tavares: “essa ideia / ninguém me tira / matéria é mentira”.
Me empresta o fogo?