As leis da física e a criação do mundo
Uma das mais estranhas novidades que a ciência produziu no século XX foi a esperança de produzir uma história completa do universo, envolvendo principalmente sua etapa mais formidável e atraente, a sua origem.
Há algum tempo assisti a uma peça teatral na qual três físicos discutem questões fundamentais. Ao longo da encenação vamos conhecendo suas personalidades. Um deles, chamemos de A, pretende ser um novo Bohr e conhecer profundamente a microfísica; outro, B, se identifica com Friedman e pretende descrever completa e definitivamente a dinâmica e evolução do universo; o terceiro, C, pretende ser a versão atual de Einstein e alterar toda a ciência futura. Com o desenrolar da peça somos informados de que, para C, não é suficiente produzir uma excelente teoria, um trabalho notável que revolucione a física: sua ambição é muito maior e transcende os limites convencionais da ciência. Não quer descrever uma teoria, mas todas!
Na peça, C passa a maior parte do tempo se perguntando o que fazer para estabelecer as regras pelas quais as leis da natureza se fizeram. Identifica a lei da física não como uma representação, mas como a tradução fiel, usando a linguagem dos físicos, do que considera as verdadeiras leis da natureza. Ele quer entender não esta ou aquela lei, mas o próprio mecanismo usado pela natureza para estabelecer suas Leis definitivas.
Esses personagens são apresentados como caricaturas de físicos e de suas vaidades pessoais. No entanto, eles não são tratados pelo público com igual atenção. Embora a maior parte do tempo a plateia sinta uma enorme empatia por C, ela considera o papel desse personagem mais inverossímil que os outros. Não em sua prática social, em sua corrida para alcançar reconhecimento e fama – mas sim quanto ao tema, que parece totalmente fora da função do cientista identificado como aquele que pretende descobrir o modo de funcionamento da natureza, não o seu porquê.
A plateia é capaz de aceitar uma nova revolução no mundo das partículas elementares. Afinal, a mecânica quântica fez isso mais de uma vez. Igualmente, não causa espanto notável que alguém possa propor uma inesperada e revolucionária descrição global do universo. Afinal, o cenário da cosmologia foi dominado durante muito tempo pela vaga e incompreensível ideia de que o universo teve um começo singular há uns poucos bilhões de anos a partir da explosão de um ovo inicial. E recentemente, começou-se a difundir a ideia (não menos difícil de compreender fora do contexto da ciência) de que o universo tenha tido uma fase de colapso anterior a esta atual fase de expansão de seu volume total.
Ou seja, as visões grandiosas de A e B e suas pretensões são consideradas como possibilidades reais, que competentes cientistas poderiam empreender com sucesso. Não criam nenhuma impossibilidade no imaginário da platéia. No entanto, parece totalmente irrealista a perspectiva de C. Não se acredita que um cientista possa mergulhar tão fundo em sua ciência para descobrir como a natureza se organiza para gerar aquilo que é descrito como “as leis da física”. A ciência descreve as leis, não como elas são feitas.
Saio desse teatro. Mergulho em outro mundo encantado e vou procurar entender por que parece tão absurda e incompreensível a tentativa de descobrir os mecanismos pelos quais a natureza constitui as leis físicas.
Não se deve perder de vista que aqui estamos lidando não com o efeito histórico das mudanças que as diferentes descobertas dos cientistas têm feito e que alteram de tempos em tempos a descrição dos fenômenos físicos e suas interconexões. Não é a essa variação sistemática e regular que estou me referindo. Mas talvez não fosse irrelevante um breve comentário sobre o modo de refletir a volúvel prática dos cientistas pois essa característica é entendida como um aperfeiçoamento do conhecimento científico associado às várias mudanças e revoluções nas principais ideias que constituem o corpo básico das leis da física, o que é típico da prática científica e que a distingue de outros modos de pensar o mundo.
Reconhecemos a mutabilidade da interpretação dos fenômenos da natureza graças aos avanços teóricos e das técnicas. Sabemos também que cada alteração na explicação de um processo físico não inviabiliza a lei vigente até então, mas sim limita o alcance de sua aplicação, propondo mudanças além do território de sua validade.
Por exemplo, Einstein e sua teoria da relatividade geral não mostraram que Newton estava errado ao estabelecer sua lei universal da gravitação, mas sim que essa lei é válida somente em um conjunto restrito de condições. A teoria de Einstein limitou o alcance da teoria newtoniana, não a inviabilizou totalmente, restringindo somente o domínio de sua aplicação.
Quando o personagem C quer conhecer como são feitas as leis da natureza, ele não está se referindo a essa mutabilidade que historiadores e filósofos como Paolo Rossi descreveram com cuidado e compreensão. Não. Aqui, está-se tratando daquelas Leis que independem dessa particular historicidade do pensamento científico. É claro que se está perseguindo uma idealização.
Em um primeiro momento dever-se-ia aceitar implicitamente que essas leis sejam válidas sempre. Ou, se não for assim, dever-se-ia entender como é possível acessar o mecanismo que controla essas alterações. A física se organizou aceitando que isso não é possível, isto é, as leis da natureza são independentes do espaço e do tempo. Em particular, as quatro forças que determinam todos os processos físicos não variam no espaço e no tempo.
A imutabilidade dessas leis faz parte da crença científica. Aceita-se que as leis descobertas na Terra e nossa vizinhança sejam válidas em todo o universo. Essa é uma boa hipótese e devemos estar preparados para alterá-la se ela conduzir a situações que entram em choque com observações. Esse é o método científico em ação.
Mas e se não for assim? E se essas leis forem dependentes de sua situação espaço-temporal no universo? E, por exemplo, se elas variarem no tempo?
Sob o espectro de Ptolomeu
O matemático francês Henri Poincaré argumentava que o papel dos astrônomos na certeza de que a Terra gira sobre seu eixo e em torno do Sol não era indispensável. Ele se convencera disso através do exame dos argumentos, cada vez mais complexos e mirabolantes, que haviam sido criados para explicar os movimentos nos céus. Depois de testar inúmeras hipóteses e ampliá-las cada vez mais com propriedades inusitadas e complexas, algum cientista – diz Poincaré — haveria de ter chegado à certeza de que a Terra não é o centro do mundo e por uma única razão: ela é a hipótese mais simples!
Esse exercício de construção teórica contado pelo filósofo Hans Blumenberg nada mais é do que um exemplo particular de uma atitude bastante disseminada entre os cientistas do que se convencionou chamar “a navalha de Occam”. A escolha do modo mais simples, do caminho menos tortuoso, daquilo que parece ser a forma natural de construir uma explicação para os fenômenos: é esse processo que se costuma atribuir ao procedimento de Occam.
A decisão de apelar para essa prática tornou-se um imperativo na comunidade dos homens de ciência que a erigiram como natural: os cientistas passaram a entender essa aceitação como condição mínima para estarem ligados à academia. Verdadeiramente, pode-se não ter nada que os una, mas conseguiu-se um protetor comum. Viver à sua sombra é diminuir os caminhos possíveis de investigação, mas protege. Aceitar esse procedimento como uma regra sólida pode impedir o crescimento do conhecimento, mas concede territórios de trânsito nas sociedades científicas.
É simples, é conveniente para a prática dos cientistas se proteger por Occam, pedir-lhe ajuda em momentos difíceis e que, de outro modo, poderiam gerar uma crise no modo racional de descrever o que existe. Entre duas descrições – uma simples e outra complexa – escolhe-se a simples. E, no entanto, como método para agilizar a solução de uma crise, como um procedimento sistemático entre alternativas que uma teoria encontra em seu caminho, essa escolha é temerária, pois a longo prazo pode gerar um poderoso e inibidor preconceito. A boutade de Poincaré pode ser criticada em diferentes graus. Vejamos um deles.
Um exemplo contundente da necessidade de uma nova versão do movimento simbolizado por Nicolau Copérnico aparece na cosmologia moderna e em sua batalha para abandonar uma condição diminuta que lhe foi imposta pelos físicos ao ser identificada como nada mais do que uma física extragalática a partir da hipótese de que não há nada de novo para além do Sol. Escolhemos usar a navalha de Occam ao aceitar que o universo se construiu a partir das mesmas leis terrestres e que elas exibem em cada parte a mesma estrutura que deve ser associada ao todo.
É compreensível que ao procurarmos as leis da natureza além de nosso sistema solar, além de nossa galáxia, em dimensões cosmológicas, comecemos esse caminho extrapolando as leis que organizamos na Terra e em nossa vizinhança. Para sustentar essa ideia ela se faz anteceder de um princípio unificador da unidade do mundo e de coerência das leis da natureza. No entanto, inibir o pensamento científico impedindo-o de ir além dessa generalização simplista tem hoje efeito semelhante ao da visão ptolomaica: antes, habitávamos o centro do mundo; hoje, propõem-se a aceitar que as leis da natureza identificadas na Terra valem para todo o universo. Trata-se do mesmo procedimento de fechamento ao novo associado à imagem do perigo que ele traz. A hipótese de que a Cosmologia não traz novidades sobre as leis fundamentais da natureza equivale a produzir a atualização dos princípios que geraram a proposta do sistema geocêntrico, submetendo o pensamento a uma prática castradora que exclui a novidade. Em outras palavras, é criar um sistema de restrições que só poderão ser eliminadas graças ao aparecimento de um novo Copérnico que, esperemos, será capaz de afugentar essas limitações abrindo o pensamento à procura de novas estruturas não convencionais e que desemboquem em riquezas conceituais inesperadas. Tudo leva a crer que esse procedimento de construção de uma configuração única capaz de representar o universo não tem fim.
Dirac, Hoyle, Lattes e outros: variação das leis físicas
Talvez Dirac tenha sido um dos mais imaginativos físicos do século XX com sucesso reconhecido por seus pares. Dentre seus trabalhos mais originais encontramos sua proposta de variação das leis físicas com a expansão do universo. Não nos interessa aqui o modo pelo qual ele propôs essa alteração. Diga-se de passagem, foi muito ingênuo e simplista. No entanto, teve a coragem de propor que as leis básicas da física não são imutáveis mas devem variar no cosmos, consequência do fato de que o universo está envolvido em um processo de expansão. Isso significa que as características do universo mudam com o passar do tempo cósmico. Se assim é, argumenta Dirac, as próprias leis físicas não poderiam exibir uma dependência com essa expansão? Ou seja, poderiam variar com o tempo. Sua proposta foi simples: somente as constantes fundamentais – que caracterizam as interações eletromagnéticas e gravitacionais – variariam
Não nos interessa aqui os passos ulteriores dessa ideia nem as razões pelas quais a grande maioria dos físicos a rejeitou, mas sim sua própria existência e o fato de que outras formas de dependência menos simplistas, mais sofisticadas, mais realistas, envolvendo outras interações da microfísica puderam ser elaboradas.
Isso nos projeta no caminho de conhecer o modo pelo qual essas variações podem acontecer e como seriam observadas. Mais adiante, o seu mecanismo de alteração deveria ser procurado, associando as alterações a algum critério de sobrevivência – latu sensu – para o universo. Proibir, por exemplo, uma lei que tenha como consequência um tempo insuficiente de existência do universo incapaz de permitir o aparecimento da vida na Terra. Ou, em caráter mais geral, sustentar a hipótese de que as leis físicas deveriam ser tais que fossem capazes de permitir estabilidade de certas configurações. Isso é considerado um bom critério.
Alguns cientistas levaram esse modo de pensar ao seu extremo argumentando que o universo produziu suas leis desse modo e não de outro precisamente para que fosse possível, em alguma época de sua evolução, o aparecimento de cientistas que refletiriam sobre essas questões. Tais propostas contêm uma série de argumentos antropomórficos que a muitos cientistas têm aparecido como inevitáveis. Trata-se de uma argumentação que, em sentido inverso, se assemelha à astrologia. Enquanto esta sustenta que há uma influência dos astros sobre o destino dos homens, a visão daqueles cosmólogos se baseia na dependência da evolução do cosmos à existência dos homens.
A essa análise que vimos fazendo podemos acrescentar uma outra questão capaz de provocar uma dificuldade maior na tentativa de formular um modelo cosmológico: a imprevisibilidade da evolução do universo. Com efeito, alguns cientistas argumentam que a descrição da matéria existente no universo e a dinâmica gravitacional que controla sua evolução permite a existência de uma fase semelhante a um processo não linear admitindo uma bifurcação – fenômeno bem conhecido pelos químicos e matemáticos – o que levaria a aceitar que as causas do mundo não estão no mundo. E se é assim, como podemos conceber uma hierarquia entre as leis e suas variações? Seria verdadeiramente possível a existência de uma tal bifurcação no universo? Essa é uma questão técnica que deixarei para examinar em outro lugar, assim como suas consequências e a imagem do universo que ela pode produzir. Um comentário adicional nessa direção permite entender as dificuldades com que poderíamos nos envolver ao tratar essa questão e que encerra o segundo ato daquela peça quando o personagem C argumenta, dirigindo-se não a seus pares A e B, mas sim à plateia:
A formação das leis físicas é concomitante com a “criação do universo”? Se as leis físicas podem evoluir, mudar com o processo de evolução do universo, poderíamos produzir uma análise dessas leis a partir de algum critério que impusermos aos objetos que existem? Como, por exemplo, o critério de estabilidade, que deveria ser precisado a partir de um antropomorfismo a que deveríamos recorrer para, a partir de nossas observações, criar um cenário de descrição que poderia ser considerado dentro dos cânones convencionais da razão física. Ou será que devemos estabelecer antes uma crítica da razão física e, nesse caso, seria mais próprio chamar de crítica da razão cósmica?
Não lembro como o terceiro e último ato daquela peça terminou. Mas se pudesse lhe dar um final eu escolheria um texto que poderia ter sido apresentado por C e permitiria entender seu caminho utópico rumo ao conhecimento de como se estruturam as leis do universo. Eis então o discurso que não aconteceu naquela peça:
A grande evolução da ciência nas últimas décadas levou-nos a nós, físicos, à conclusão de que ao empreendermos o exame, na elaboração da cosmologia, de tudo que existe, a saber: o espaço, o tempo, a matéria e a energia, estaríamos assim atingindo (mantendo-nos, em conformidade com a tradição da física, no interior da prática científica) as fronteiras mais externas permissíveis a todo conhecimento que se pretende científico.
No entanto hoje – por razões e práticas que já comentei em outros lugares – somos conduzidos a reconhecer, talvez contra uma das mais sólidas crenças em nossa visão racional da natureza, que nós (os físicos) estávamos profundamente enganados. Não somente é possível ir além da cosmologia – enquanto prática científica – mas uma série de questões geradas naquela atividade assim o exigem. Dentre essas a mais formidável é precisamente aquela que estamos considerando: a criação do universo.
Sabíamos de longa data que toda tentativa de organização de uma estrutura coerente do universo, para além de suas dificuldades observacionais, que pretenda coordenar sequências de mundos, esbarra inevitavelmente em uma selva linguística. Trata-se aí, preliminarmente, de uma análise verbal. Por exemplo, os infinitos tempos que se repetem, os possíveis ciclos de universo que antecederam e que seguirão eventualmente esse nosso cosmos, os diferentes universos-filhotes, suas interconexões ou sequências existenciais não podem constituir uma cosmologia, mas tratam de outra coisa, têm outro objetivo: tratam de estruturas que estão e estarão, talvez para sempre, no domínio da imaginação, do ultrassensível, dentro de um programa teórico fora de controle observacional.
Os físicos de hoje e de sempre não escapam dessa tentação e, mais do que isso, não sabem resistir a ela. Infelizmente (ou não) parece não existir alternativa fora dessa fórmula: metacosmologia é onde todos nós, físicos e cosmólogos, cedo ou tarde, conscientemente ou não, em nossa prática e sem sair dela, devemos penetrar. A menos que por algum sortilégio fantasioso, e sem estarmos em seu controle, nos encontremos em face de uma tentação dogmática, como vez por outra já nos ocorreu. Aí, e somente aí, podemos parar nossa investigação e encerrar nossa pesquisa nos escondendo por detrás de um dogma, venha ele travestido de qualquer forma. A partir de então termina nossa caminhada como cientistas: começa o tempo da narração.
Mas o que é isso, a metacosmologia? Para entender o significado dessa expressão e colocá-la no contexto da prática científica podemos escutar o que nos diz o texto do livro “O que é Cosmologia?”:
A análise da aplicação das leis da física ao universo bem como sua extensão iniciada por Einstein que vimos examinando neste nosso ensaio, serviu para que pudéssemos ter uma ideia, mesmo que superficial, da função da cosmologia. Depois desse longo caminho podemos olhar para trás e rever a estrada por onde caminhamos e se conseguimos sair da floresta ou se nos perdemos por lá. Afinal de contas, um caminhante que se embrenha na floresta pode iniciar seu caminho aleatoriamente ou seguir passo a passo o que lhe indica um mapa. Em qualquer um dos casos ele pode vez por outra modificar sua direção. Ou para adequar-se mais corretamente ao mapa do qual, por alguma forma, se desviara; ou por algum detalhe local que atraia sua atenção, como a aparição de uma nova espécie de planta que lhe pareça particularmente especial e que jamais vira. No segundo caso ele é livre para errar; no primeiro caso, ele segue um plano que lhe rouba a alegria da descoberta, mas lhe garante a segurança que o leva a caminhar e sair da floresta. A escolha de uma ou outra dessas atitudes depende de cada um. Fizemos uma escolha especial e quero agora fazer um balanço desta escolha.
Podemos dizer que a visão global, consubstanciada na estrutura universo, ocupa hoje um lugar de destaque no pensamento científico contemporâneo. Mais que isso, o conceito de totalidade que a cosmologia produziu permeia praticamente toda a atividade da física fundamental. Desde a segunda metade da década de 1960 a grande comunidade de cientistas, formada por cosmólogos, astrônomos, físicos, astrofísicos e outros, a utilizam e fazem dela uma noção convencional, de par com demais conceitos e características específicas com que elaboram e dão significado aos diversos fenômenos e processos observados. A partir daí colocam-se questões, indagações sobre o encadeamento formal daqueles processos e fenômenos, que seriam reduzidas, menores, incompletas sem esse componente global. Por razões que comentamos atrás, não devemos aceitar a tentativa, baseada em uma ideologia pragmática, instrumentalista, de redução da função da cosmologia, limitando seu alcance e retirando sua grandiosidade, como se ela fora somente uma física extragalática. Uma tal função, conforme vimos, pertence a uma ontologia regional; ela não possui a ambição de estabelecer uma refundação global, completa da física.
Ao tentar deixar de lado a função mais importante da cosmologia, perpetra-se um movimento de diminuição de seu papel que tem várias consequências, dentre as quais a que aparece como a mais dramática consiste na impossibilidade de produzir uma explicação do momento da criação, na versão original do big bang, que se constituiria, graças a essa inacessibilidade, na aceitação da existência de um momento único de criação de tudo-que-existe, inacessível não somente à observação, como a qualquer descrição racional – conduzindo inevitavelmente ao suicídio da razão cósmica.
A cosmologia foi severamente criticada precisamente por sua ambição de produzir afirmativas sobre o mundo que a física se impôs não fazer. E esse impedimento não foi imposto de fora. Não provém de nenhuma tentativa de um outro saber que teria levado a impedir tal movimento. Não, essa impossibilidade veio de dentro, teve sua origem no núcleo duro dessa ciência, refletido na tentativa da redução da função da cosmologia a uma física extragalática. Entre as afirmativas, típicas de seu território de investigação, estão algumas que vimos comentando, a saber:
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Qual a origem da expansão global do universo?
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Quais são os dados iniciais do universo?
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As leis da física terrestre são válidas em todo o cosmos?
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Existem mais dimensões do que as quatro de espaço-tempo?
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Por que existe mais matéria do que antimatéria?
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Por que existe alguma coisa e não nada?
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Por que a massa das partículas elementares, como o próton e o elétron, tem o valor que possuem e não outro?
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Por que a entropia sempre aumenta?
A cosmologia está produzindo um discurso sobre essas questões, permitindo penetrá-las e produzir, inventar e codificar algum conhecimento sobre elas. Isso nos ajuda a entender porque vimos afirmando um modo novo de conceber seu papel. Sua verdadeira dimensão deve ser procurada precisamente no lugar em que se produz acesso a esse tipo de questões. Para desempenhar esse papel, a cosmologia deve refundar a física, reexaminar os fundamentos sobre os quais ela repousa e se sustenta. A refundação da física requer a orquestração da totalidade do mundo. Essa é a função da cosmologia. As diferentes partes, os diferentes setores da física somados, não produzem um discurso completo sobre o mundo. Falta alguma coisa, falta a base sobre a qual podemos descrever e fundamentar um discurso exaustivo e completo sobre o mundo. Isso que falta, essa ausência inibidora de um projeto maior, é a cosmologia que provê. É ela que tem a função de sustentar esse discurso global sobre o mundo. E sem esse discurso, a física – nosso conhecimento científico e racional sobre a natureza – fica multifacetado, dividido, não tem a condição requerida capaz de permitir que descrevamos de um modo unificado a totalidade de nossas observações; e, mais grave ainda, sem que possamos organizar esse conhecimento integrado a partir de um ponto de apoio descrito em seu interior. Assim, com prática análoga à que os filósofos das ontologias representam a função crítica de Kant, como uma refundação da metafísica tradicional, ao proceder à refundação da física, incorporando todas as forças da natureza, produzindo uma descrição completa do universo, tentando responder às questões que acima enumeramos e outras que aparecem nas bordas de nosso conhecimento, realiza-se uma verdadeira crítica dessa ciência. É essa a função que devemos atribuir à cosmologia, retirando-a do domínio restrito que lhe foi imposto, de ser identificada com uma física extragalática, para produzir uma metacosmologia.
Os físicos haviam alertado para as dificuldades inevitáveis que aparecem ao se examinarem processos que estão fora de nosso controle formal ou observacional. A orientação correta exige que o cientista, contrariamente a uma lenda romântica, só deveria investigar questões que podem ser resolvidas. Parece que aquelas análises apontadas acima e que o cosmólogo veio à cena para anunciar não obedecem a essa regra e produzem confusão e descrédito do pensamento racional. Embora ousada demais, essa análise sustenta que o anunciado “fim da ciência” não coincide com a completa explicação formal dos fenômenos observados, mas sim porque alguns cosmólogos, por distração ou profunda lealdade à sua consciência como cientista, ousaram violar aquela regra.
O objetivo do personagem C da peça original parece estar irremediavelmente fadado ao fracasso: do que vimos acima, não se trata mais de conhecer como se organizam as leis físicas, essa não é a boa questão, pois ela não vai fundo no pensamento, não desce às profundezas onde a razão se organiza. A verdadeira questão está escondida no modo pelo qual algumas estruturas observadas, alguns fenômenos admitem uma ordenação formal que a qualifique como uma lei. Como é isso possível? Essa constatação requer um esforço para acordarmos desse pesadelo racional e – por que não? – nos pormos na estrada que o personagem C escolheu seguir. Para iniciar essa caminhada, transcrevo abaixo o texto no qual apresentou sua visão da formação das leis físicas, ou melhor, sua leitura dos diversos modelos de criação do universo que os cientistas produziram nas últimas décadas.
A criação do mundo
Existem aqueles que não consideram a análise das origens do universo como uma questão digna de atenção dos cientistas e que merece ser tratada com interesse. Há mesmo quem não aceita sequer que ela tenha significado e que possa ser entendida como uma questão bem colocada pela ciência. Podemos ouvi-la argumentar que essa pergunta – “qual a origem do universo?” – não faz sentido e que o simples fato de que não conseguimos encontrar uma resposta única deveria ser motivo suficiente para sua desqualificação.
Não é para essa pessoa que escrevo. Meu comentário é dirigido para aquele que considera a indagação sobre as origens do mundo como uma questão relevante. Mais ainda, como uma questão primordial e tão importante que a ela devemos tentar responder com o máximo cuidado e atenção. A ela poderíamos consagrar uma vida e persistir no desconhecido caminho para sua compreensão. As antigas civilizações se ocuparam dessa questão que orientava suas sociedades e que estava presente a cada momento de sua história. No século XX os cientistas ousaram propor sua versão. É dela que quero tratar aqui.
I. Mitos cosmogônicos (de criação do mundo)
Uma curiosa distinção entre as cosmogonias criadas nas antigas civilizações através de uma prática religiosa e as desenvolvidas pela ciência em especial no século XX é a seguinte: os mitos religiosos estão estabelecidos de uma vez por todas, eles não mudam. Dito de outro modo, não existe nenhum mecanismo para efetivar uma eventual alteração do texto original e seu aggiornamento a alguma circunstância ou fato atual.
De outro modo, como o conhecimento científico é variável, sua explicação da origem de tudo-que-existe muda de tempos em tempos. Nesse aspecto, ela não é confiável, isto é, sua interpretação e explicação da origem do mundo é instável como o próprio conhecimento científico. Uma tal distinção está longe de tornar a explicação científica menos verdadeira, mas ela deveria se apresentar menos impositiva.
Parece que temos aqui um aparente paradoxo: graças a seu método racional e da prática de testar seus enunciados, a ciência seguidamente modifica seu discurso sobre os processos observados no mundo. Isso diz respeito também a seu enunciado sobre a origem do universo.
Por outro lado, as cosmogonias antigas têm como sistemática a produção espontânea de distintas versões da criação, livres de compromisso com o método científico. Assim, embora sejam desprezadas pelos cientistas como falsas representações da realidade, elas são permanentes, constantes ao longo da história daqueles povos ou grupos que a aceitaram ou ainda aceitam como a verdadeira descrição do começo do mundo. A cosmogonia científica é exata, mas cambiante. Assim, dela poderíamos dizer que não é confiável. Embora essa característica seja típica de toda atividade científica.
II. Semelhança das descrições da origem do mundo
Não se conhece nenhuma civilização durável que não tenha produzido uma história completa sobre o nascimento do mundo. A semelhança existente entre essas versões, ocorrida em territórios tão afastados no espaço – como o Egito, a Turquia, a América, a Índia e a China – bem como no tempo, separadas por centenas de anos, foram motivo de longas reflexões, sem que no entanto uma explicação completa e isenta de hipóteses esdrúxulas tenha aparecido.
Mesmo na ausência de uma consequente explicação formal, o reconhecimento da existência dessa semelhança entre as diversas versões da criação do mundo das civilizações antigas, não provocou nenhum mal-estar formal, não choca o pensamento racional do Ocidente.
No entanto, comparar essas versões com aquela elaborada pelos cientistas ao longo do século XX e constatar a persistência de uma semelhança formal cria um estado de excitação e o aparecimento de uma questão que não pode ser ignorada.
Com efeito, uma leitura, mesmo que superficial, das diversas descrições do nascimento do mundo produzidas pelas civilizações do passado e a recente produção de uma história completa do universo elaborada pelos cientistas provoca, sem dúvida, um inesperado e desconfortável sentimento de dejà vu.
Parece que estamos acessando um mesmo e único processo, uma mesma história contada com nuances de diferentes narradores que lhes empresta um tom particular, sem que os seus fundamentos e fio condutor único sejam abalados.
Seria essa semelhança de descrição uma simples questão de limitação de nosso imaginário? Ou seria associada ao inconsciente coletivo como sugerido por Jung? Ou, em outra perspectiva, nada mais do que uma limitada sequência lógica que não pode ser ultrapassada?
Para ilustrar esse comentário nós iremos seguir um caminho que permite realizar essa comparação, ao menos em sua aparência maior, sem descer a detalhes específicos que, esses sim, fazem aparecer distinções e reduzir suas semelhanças. Nós faremos isso usando de um lado uma versão do nascimento do mundo no Egito antigo (século IV a.C.) e uma versão da cosmologia científica do final do século XX. Irei rever muito brevemente a primeira e me concentrarei nos detalhes específicos da versão científica. Ademais, como essa versão se baseia em um cenário teórico ainda em formação, iremos comentar algumas possibilidades que foram e estão ainda sendo investigadas pelos cientistas na elaboração de uma história completa do cosmos que envolva não somente sua evolução mas que produza uma aceitável descrição científica da origem do universo.
III. Nascimento do mundo segundo a mitologia egípcia (séc. IV a.C.)
Houve várias versões sobre o nascimento do mundo no Egito antigo. A estrutura das organizações estatais das grandes cidades, bem como as do interior, permitiu o aparecimento de múltiplos mitos de criação. Particularmente significativo é o reconhecimento de que àquela época nenhuma crença tornava necessariamente as demais inaceitáveis. Nada semelhante na Cosmologia moderna. Por ter um status diferente (não se trata pois de uma crença, mas de conhecimento científico) cada modelo cosmológico exige que os concorrentes sejam considerados falsos e inaceitáveis.
Nas descrições mitológicas da gênese, as coisas criadas não saíram do nada(ex nihilo) pela ação de uma divindade atemporal. Havia, de diversos modos e com variadas versões, aquilo que podemos chamar o mundo anterior. O que havia antes, o caos, era de um certo modo o “negativo do presente, o contrário dos elementos constituintes do mundo criado”.
Sauneron nos alerta para essa interpretação de sabor metafísico ausente naqueles tempos antigos e enfatiza que essa é a descrição feita por nós, hoje, sobre aquelas narrações antigas. Devemos reter seu comentário e relativizar nosso discurso sobre esses mitos cosmogônicos. Tendo esse cuidado como pano de fundo, podemos seguir adiante.
Esse mundo anterior era personificado e a ele se atribuiu um nome, um som, Noun, para caracterizar e nomear aquele que nasceu de si mesmo. Assim, exceto esse Noun, tudo o mais teve um começo induzido por Noun, que seria denominado o Criador, aquele que criou e/ou cria.
A ciência moderna deve fazer face à mesma dificuldade e produz uma saída semelhante a essa. Na Cosmologia científica moderna tudo teve um começo induzido, exceto o campo gravitacional, que é capaz de gerar a si próprio devido à não linearidade que lhe é característica. O protodemiurgo (versão mítica egípcia) ou a gravitação (versão científica) tem uma única função: gerar a condição para que se possa construir um mundo.
IV. Nascimento do mundo segundo a ciência (cosmologia) (séc. XX d.C.)
Houve várias versões sobre o nascimento do mundo na ciência moderna. A estrutura das organizações científicas dos institutos de pesquisa e universidades dos tempos atuais permitiu o aparecimento de diversos modos de formação do universo. Particularmente significativo é o reconhecimento de que um dado modelo de criação torna necessariamente os demais inaceitáveis. Por ter um status diferente dos mitos antigos (aqui, não se trata de uma crença, mas de conhecimento entendido como verdadeiro, pois científico) cada modelo cosmológico torna os demais falsos e inaceitáveis.
Na maioria das diversas descrições cósmicas as coisas criadas não saíram do nada(ex nihilo) pela ação de uma força atemporal. Havia, de diversos modos e com variadas versões, aquilo que podemos chamar o mundo anterior. Nesses cenários, o que havia antes, o caos, era de um certo modo o “negativo do presente, o contrário dos elementos constituintes do mundo criado”.
Devemos alertar o leitor para essa interpretação de sabor metafísico que em geral desagrada e é desqualificada pela maioria dos cientistas e reter esse comentário para relativizar nosso discurso. Tendo esse cuidado como pano de fundo, podemos seguir adiante.
Esse mundo anterior era personificado e a ele se atribuiu um nome, um som, que caracteriza a estrutura mais fundamental a partir da qual tudo sairá: a estrutura do espaço-tempo ou melhor, sua geometria ou, melhor ainda, a gravitação que na formulação moderna determina e constitui a estrutura geométrica do mundo. Nessa formulação, esse nome, a gravitação, serve para caracterizar e nomear aquilo que nasceu de si mesmo.
Assim, como ocorre na mitologia, à parte Noun, tudo o mais teve um começo induzido (por Noun, que seria denominado o Criador, aquele que criou e/ou cria). O pensamento racional moderno atribui essa função à gravitação.
Os cientistas de hoje se envolvem na mesma dificuldade que vinte e quatro séculos atrás nossos antepassados se envolveram e produz uma solução semelhante. Com efeito, na Cosmologia científica moderna tudo teve um começo induzido exceto o campo gravitacional que é capaz de gerar a si próprio devido à não linearidade que lhe é característica.
O protodemiurgo (versão mítica egípcia) ou a gravitação (versão científica global) tem uma única função: gerar a condição para que se possa construir um mundo, aquilo que hoje chamamos universo.
V. Eternidade ou finitude do mundo
A história da cosmologia a partir do século XX pode ser assim sintetizada:
- A interação gravitacional determina a geometria do mundo;
- Essa geometria (riemanniana) possui uma dinâmica (variação do volume global que aumenta com o tempo cósmico);
- Pode-se fixar o começo de uma era associando-a ao valor mínimo de seu volume espacial;
- Esse mínimo pode ser zero ou ter um valor extremamente pequeno mas finito;
- No caso de ser diferente de zero pode-se pensar em uma era anterior (regida por um colapso ao invés de expansão, na qual o volume global diminui com o passar do tempo, atinge um valor mínimo e começa então sua fase de expansão onde o volume aumenta com o passar do tempo);
- Nesse caso poderia ocorrer uma série (finita ou não) de ciclos de colapso seguido de expansão e novamente colapso e assim sucessivamente. É admissível considerar a possibilidade de que a expressão das leis físicas poderia ter estruturas formais variáveis.
- Ou seja, o universo pode ter sido criado a um tempo finito ou pode ser eterno, com sua existência podendo ser extrapolada para um passado infinito.
VI. Uma versão científica completa do universo: detalhes.
No primeiro momento é preciso escolher a teoria que controla a estrutura que serve como território no espaço e no tempo onde a matéria se distribui. Desde 1915, com o aparecimento da teoria da relatividade geral, essa função é controlada pela força gravitacional. Como essa teoria é não linear, isso significa que gravitação gera gravitação. Ou seja, embora possa haver ação da matéria e energia sob qualquer forma, sobre o campo gravitacional, ele pode gerar a si próprio.
Isso permite pensar um mundo sem substância, existindo somente como um autoprocesso gravitacional. Isto é, a gravitação pode ser anterior (não somente em sua estrutura lógica, como ontológica) à matéria.
Admitido que a matéria (sob qualquer forma) pode ser gerada por um campo gravitacional primordial, algumas questões aparecem de imediato. Sabemos que a matéria é formada de elementos fundamentais como os léptons (elétron, neutrino e outros) e os quarks (que geram próton, nêutron e outros). Essas estruturas elementares possuem suas existências duplicadas por suas versões complementares, suas antipartículas. Se aceitarmos que é o campo gravitacional a origem de toda matéria, aparecem algumas questões – que embora por demais técnicas, creio que devo citá-las para balizar esse comentário – dentre as quais distinguir as assimetrias observadas, algumas no mundo microscópico, outras no universo para além de nossa galáxia, como por exemplo:
- Matéria ou antimatéria;
- Conservação da paridade (P) ou violação: alguns processos físicos são independentes da orientação espacial, outros não;
- Conservação da carga (elétrica e outras) ou violação: alguns processos físicos são independentes do sinal da carga;
- Violação da dupla transformação CP: havendo ou não violação da paridade e da carga as transformações CPT são preservadas, onde T é a inversão temporal. Ou seja, pode ocorrer irreversibilidade temporal no mundo microscópico.
Além dessas propriedades, outras aparecem no horizonte, como a origem da massa das partículas elementares, a existência da carga do elétron e a neutralidade do neutrino e muitas outras.
Em um segundo momento devemos nos voltar para entender as diferentes possibilidades associadas aos modos de criação do universo, a saber:
- Momento único tipo big bang segundo o qual toda a matéria do mundo é criada em um só processo singular e incontrolável;
- Continuamente, segundo o qual o universo experimenta um processo de criação interminável e a partir do qual esse mecanismo deveria ser entendido como dando origem a um universo eternamente em formação;
- De modo descontinuo mas permanente, se formaria nova matéria preferencialmente em torno da matéria pré-existente e que participaria nesse mecanismo de modo efetivo;
- Haveria buracos brancos no universo que ejetariam matéria nova de modo incontrolável;
- A existência de bifurcação no universo inviabiliza a ideia de uma configuração única capaz de estar deterministicamente relacionada a uma configuração primitiva.
- É possível entender a geração da matéria (sob qualquer forma) como um processo controlado pela força gravitacional;
- Aparece assim naturalmente uma hierarquia ontológica: a geometria antecede a matéria, toda substância ponderável e energia têm origem em flutuações do espaço-tempo;
- Esse campo gravitacional primordial se constrói em um processo não linear;
E assim podemos organizar uma cosmogonia capaz de dar sentido à criação da matéria do mundo; e uma cosmologia capaz de gerenciar a evolução da geometria do espaço-tempo.
A origem do processo dinâmico do estado fundamental da geometria do espaço-tempo decorre, nos cenários de universo eterno, da instabilidade do vazio, entendido este como um estado quântico; ou seja, um vazio cheio de potencialidades, associado aos campos de matéria compossíveis. Nessa formulação, o universo nada mais é do que uma consequência inevitável da instabilidade do vazio do espaço-tempo.
É então que aparece a antiga questão: Deus poderia não criar um mundo?Ou, em sua versão moderna, adaptada à ciência: é possível imaginar um vazio estável?
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Bibliografia
Mario Novello: O que é cosmologia? Ed. Jorge Zahar, (Rio)2006.
Mario Novello: Cosmos et contexte, Ed. Masson (Paris) 1987.
Serge Sauneron na obra coletiva La naissance du monde, Ed. du Seuil, Paris, 1959.