As leis do cosmos e a liberdade do homem: Giovanni Pico della Mirandola e Leon Battista Alberti
1. Pico e Alberti
Eugenio Garin, no seu ensaio sobre Leon Battista Alberti, publicado em 1975, enfatizava como “estranhamente ninguém havia notado que algumas décadas antes que Giovanni Pico della Mirandola compusesse a famosa abertura hermética da Oratio de Hominis Dignitate, Alberti já havia escrito a paródia”[2]. Segundo Annarita Angelini, “contraste, crise, ambivalência, impossibilidade de uma solução pacificante acompanham toda a reflexão de Alberti” [3] e são elementos que confirmam claramente o caráter “invertido” da antropologia albertiana a respeito da clara imagem do “divino camaleão” do célebre Discurso de Pico. Os tons fortemente pessimistas de Alberti no Theogenius, no Momus e nas Intercenales são verdadeiramente tão distantes quanto se poderia pensar da celebração de Pico da dignidade humana, e os dois autores parecem exprimir perfeitamente aquela tensão entre humanismo e anti-humanismo sobre a qual tem insistido parte da historiografia recente. Como notou Carlos Brandão, não se trata, porém, de uma contraposição de dois momentos sucessivos do pensamento renascentista, mas de uma dialética profunda que atravessa todo o humanismo: humanismo e anti-humanismo – escreve Brandão – “são polos que estão em luta permanente desde o início do Renascimento, que se tencionam reciprocamente e que não mais nos permitem ter dele a visão homogênea que predominou na historiografia herdada de Burckhardt e de Michelet”[4].
Aquela que pode parecer ser uma fratura irremediável entre dois aspectos antitéticos do humanismo, de uma parte o otimismo celebrante, a grandeza humana unida ao triunfo da vontade de potência do homem sobre a natureza, e ,de outra, a visão trágica do homem entendido como “ponto de crise” e “momento de fratura de uma ordem”[5], é em realidade o fundamento de uma tensão dialética mais profunda, é o sinal de uma pesquisa que combina autores muito diversos entre si e que define a urgência mais radical do humanismo italiano. O Alberti da obra De re aedificatoria se move em uma direção oposta da denúncia da inutilidade e da loucura do agir humano do Theogenius, e a mesma reversão se dá entre a extraordinária celebração do ser humano na Oratio de Giovanni Pico e as observações que o filósofo faz nas suas Disputationes quando pensa a humanidade como a um bando de “homúnculos inclinados para o chão”[6]. A propósito da obra de Alberti, Garin escreveu que nele “várias perspectivas coexistem na sua contraditoriedade, porque contraditória, e cheia de loucura, é a inteira realidade”[7], e é no fundo o mesmo esforço que para muitos aspectos se encontra também nas obras de um pensador como Pico. A reflexão sobre a relação entre cosmologia, ética e natureza em Giovanni Pico e Leon Battista Alberti se joga de fato sobre este espaço, de dois pensadores certamente muito diferentes entre si, mas unidos por uma ideia de filosofia que não renuncia jamais de interrogar-se sobre as contradições mais profundas do homem e da natureza: em ambos age aquela tensão entre procura de significado e desilusão, entre vontade de saber e a consciência do limite humano, entre confiança no homem e consciência de sua fraqueza, que caracteriza os momentos mais altos da filosofia do Quattrocento.
2. Definição da ordem
O problema que está na base da relação entre cosmologia, ética e natureza em grande parte da filosofia do Quattrocento pode ser afrontado a partir do conceito de ordem: existe uma ordem em natura que transforma a matéria desordenada em um cosmo harmônico e ordenado? Qual é o arquiteto – se existe – que projetou a perfeita máquina do cosmo? E se esta ordem existe, o homem possui a possibilidade de compreendê-la e de adequar a própria ação moral às leis naturais das coisas?
Para Leon Battista Alberti, a natureza é em si sempre “absolutamente perfeita”[8]. Enquanto na variedade dos tons da obra albertiana essa ideia nunca muda, mesmo que com acentos diversos. Para vingar-se dos Deuses, Momo se faz primeiro poeta e depois filósofo para ensinar que “todos os seres animados têm uma única divindade em comum, a Natureza, que tem a missão precisa de governar não apenas os homens, mas todos os outros animais”[9]; além disso “todas as coisas criadas pela Natureza têm uma função bem precisa, que são boas ou ruins do ponto de vista humano”[10], mas a ordem da natureza é perfeita e superior ao juízo do homem, de fato – prossegue Alberti – […] “muitas coisas que o preconceito comum entende por defeitos não o são de fato” [11]. Confrontando essa ideia com um texto muito diferente pelos tons e cenários, a ideia de fundo não parece mudar: no De Iciarchia é per natura que o homem nasce capaz de reconhecer as razões e as ordens das coisas”[12], e é sempre a natureza que define “aquilo que o homem deve temer ou fugir”[13]. A esse ponto não existe nenhuma fratura entre indivíduo e a natureza: a ordem das coisas compreende em si o homem como uma das tantas partes do grande desenho do mundo. A natureza “jamais errou e jamais errará” – escreve Alberti – por isso forneceu ao homem intelecto, razão e a linguagem[14] de modo que pudesse inserir-se no projeto da natureza como um ser “útil a si, e não menor aos outros”[15]. Tanto se consideramos o homem como uma brincadeira da natureza, como se atribuímos a ele a possibilidade de agir de maneira virtuosa – em conformidade com os ditames naturais da razão – resta inalterada a ideia de uma ordem natural por si só justa e infalível. No Theogenius, a ideia de uma ordem estável e imprescindível da natureza se impõe com igual clareza: “certa consiste ferma e constante sempre in ogni suo ordine e progresso la natura; nulla suol variare, nulla uscire da sua imposta e ascritta legge”[16]. Porém, paradoxalmente, o elemento de estabilidade no qual se explica a lei natural é quanto mais instável seja, é o movimento perpétuo de todas as coisas, é o eterno fluxo de se tornar: “a tutte l’altre cose mortali – escreve Alberti no Theogenius – vediamo essere fatale e ascritto ordine dalla natura che sempre stiano in moto, e in difforme successo vediamo e’ cieli continuo innovare sua varietà”, uma variedade não distante da hipótese de que no Momus se vai até a ideia de “infinitos mundos que se formam e se desgastam continuamente”, “mundos de formas variadas” regidos apenas pela ordem da eterna mudança[17].
A ideia de natureza de Pico é bem diversa daquela de Alberti: ao mundo físico não pode pertencer nenhuma perfeição verdadeira, porque perfeito é somente o mundo intangível, perfeitas são as ideias que governam o todo, e a natureza deste mundo não é outra coisa que um equilíbrio instável das partes. Isso não impede Pico de pensar em uma ordem física regida de qualquer modo por regras precisas; ao contrário, é própria a imperfeição da natureza a conditio sine qua non da sua beleza. Na Heptaplus o mundo físico deriva de “uma comum mistura, de todo modo regulada por normas”[18], de uma união de matéria e forma provisória e temporal, mas ordenada e não casual. É a mesma lógica segundo a qual no Commento Pico define a natureza citando Heráclito e Homero: “diceva Eraclito la guerra e la contenzione essere padre e genetrice delle cose; e, appresso Omero, chi maladisce la contenzione è detto aver bestemmiato la natura”[19]. A ideia de natureza como eterna luta entre os componentes que formam os corpos não exprime apenas a eterna mudança e a degeneração do mundo físico; ao invés disso, é a premissa necessária para pensar em uma “mistura proporcional” entre as partes e, portanto, uma “amiga inimizade” que assinala a passagem da matéria sem forma a um cosmo organizado: “a beleza inclui em si qualquer imperfeição”[20] – escreve Pico – e nesse sentido a beleza propriamente dita é somente do mundo humano e a natureza, mas não a Deus.
A “concordia discordia” entre as partes, porém, não pode realizar somente equilíbrios provisórios em um círculo onde as mesmas regras que estruturam o mundo físico o configuram como perene “vicissitude de vida e de morte”[21]. É aqui então que a ordem da natureza, entendida como perfeição absoluta da Alberti e como harmonia que nasce do conflito em Pico, se encontra com o problema do tempo. O tempo da natureza, que em Alberti indica a hipótese de um infinito alternar-se de mundos diversos e em Pico os riscos dos equilíbrios que sempre podem ser destruídos, mas também o tempo do homem, tão breve para compreender a ordem da natureza e tão incerto para evitar os riscos do acaso e da liberdade.
3. Destruição da ordem
Qual é o lugar e a função do homem de frente a natureza “absolutamente perfeita” de Alberti, ou de frente ao frágil equilíbrio da “concordia discordia” da qual Pico fala? E em que modo o homem pode compreender a ordem perfeita da natureza ou até mesmo modificá-la e destruí-la? Do tempo humano nasce o conflito entre natureza e vontade, entre a ordem do cosmo e a liberdade. O arquiteto do De re aedificatoria, o “omicciuolo” do Theogenius, o “divino camaleão” da Oratio e os “homúnculos” das Disputationes, têm todos uma coisa em comum: estão de frente ao mesmo abismo, e esse abismo é o tempo. Seja Alberti, seja Pico, citam os versos extraordinários de Píndaro: os homens são “criaturas de um dia”, epàmeroi, sonhos de uma sombra[22]. Pico os usa no seu Commento para descrever a condição terrena do homem[23], Alberti os transforma em uma extraordinária página do Theogenius: “quase sombra de um sonho” é o homem[24]. A consciência da temporalidade transforma o homem em sombra de si mesmo, na inconsistência do reflexo de um sonho, e é precisamente essa transfiguração do humano colocado de frente da própria temporalidade que rende todo incerto e indefinido. Incerta e indefinida é a história do pensamento humano, que para Pico fica sempre escondida dentro dos véus dos antigos mitos, dentro das palavras dos poetas, dentro da complexa simbologia da cabala e dos textos sacros. Incerto é o conhecimento que o homem pode ter de si mesmo, de uma criatura que não possui uma existência definível, mas que contém em si um abismo indefinido de todas as possibilidades de ser. Enfim, é incerta a consciência que o homem tem da natureza, porque os tempos da natureza superam a capacidade da racionalidade humana e das suas linguagens. “Cada indagação – escreve Pico – de qualquer fenômeno se ocupa, conhece de certa forma o verossímil, e não a verdade”[25], e desse modo o filósofo de Pico não é de fato distante do arquiteto de Alberti: colocado em um mundo de aparências, é o sujeito que interpreta a realidade construindo relações verossímeis entre os fenômenos[26]. O filósofo o faz comparando todas as tradições filosóficas para reinterpretá-las e recolocá-las ao interno de um quadro mais geral, a “concórdia philosophorum” na qual os elementos de cada uma se harmonizam em uma “nova philosophia” entendida como reformulação e recomposição do passado. O arquiteto de Alberti do mesmo modo deve elaborar uma estratégia para remodelar a relação entre os elementos e não cria uma nova ordem do nada, mas reelabora e reformula as proporções e as relações de força entre as partes[27]. Em Pico a condição que permite ao sujeito seguir essa estrada é a liberdade, e é propriamente a partir da instância ético-moral da liberdade que Pico coloca radicalmente em discussão a versão aristotélica-ptolemaica do cosmo.
Para reivindicar a liberdade do homem de uma influência dos planetas e da astrologia, Pico sustenta que o homem não pode ser escravo das influências celestes, porque as influências astrais não são causas universais e os únicos verdadeiramente observáveis são relacionados apenas à luz, ao movimento e ao calor, todos elementos que certamente influenciam o mundo físico, mas que de nenhum modo podem colocar em discussão o livre arbítrio[28]. Em segundo lugar, Pico põe um problema de método: se também existissem outros elementos celestes capazes de agir sobre a realidade humana, a astrologia não teria os instrumentos para prevê-los[29]. O raciocínio de Pico sobre o método é estreitamente ligado à perspectiva histórica dentro da qual se coloca toda a sua crítica à astrologia, e é este o elemento mais forte do discurso de Pico: a história falsifica não apenas todos os prognósticos da astrologia, mas mina também o estatuto epistemológico de cada conhecimento astronômico:
“Os modernos afirmam a existência de numerosos e vários movimentos dos corpos celestes, desconhecidos como esses, creem nos antigos, e aferrados finalmente a uma longa e constante observação. Então, o seu exemplo faz manifesta a possibilidade que outros movimentos ainda são vedados aos astrônomos por sua lentidão, por sua obscuridade ou por outra razão que os homens da posteridade um dia conhecerão através de mais observações.”[30]
Os tempos e a vastidão do cosmo se chocam com os limites da observação humana e historicamente muitas verdades da astronomia foram destruídas porque o objeto de estudo é tal de excluir qualquer conhecimento certo. É nesse sentido que Pico critica as bases da cosmologia aristotélica-ptolemaica, transformando o problema da estrutura do universo naquele das capacidades humanas de compreendê-lo, para chegar à conclusão que nenhum sistema cosmológico elaborado por um homem poderá jamais ser exaustivo e perfeito. Depois de ter discutido as hipóteses de Ptolomeu, Giovanni da Saxônia, Haly e Leone Hebreu sobre a possibilidade de admitir oito, nove ou dez esferas, Pico conclui de fato afirmando que “nós temos relatado todas essas hipóteses para afirmar que em tal argumento nada se pode sustentar de certo e de inquestionável, porque cada discussão termina em posições prováveis e mutáveis”[31]. O conhecimento humano do cosmo e da natureza é definido como provável e mutável, não apenas pela vastidão do objeto e a dificuldade de observação, mas também porque quem realiza o estudo sobre o assunto é o homem – um ser constitutivamente mutável e em construção.
O homem de Pico é plena indeterminação, de uma parte é um ponto de ruptura na ordem da natureza, de outra é síntese e termo de união. Posto que a natureza seja uma sucessão de equilíbrios provisórios, uma alternância de formas e misturas na qual as proporções se realizam em uma beleza e uma ordem destinadas a dissolver-se e talvez a recompor-se em outras formas, o homem é o elemento que realiza o sentido desse fluir, compreendendo-o em si e fixando-o. O “divino camaleão” de Pico não tem essência fixa, caso contrário não poderia de nenhum modo compreender em si uma realidade multiforme e fugaz. Como escreveu Carlos Brandão, também o homem de Alberti “não se define como uma essência fixa”, mas é “um homem fragmentado, individuo “em divisão”, metamórfico, camaleônico”[32]. Adamo e Narciso, ambos de essência indefinida e impenetrável, um, “extraordinário escultor” de si mesmo, o outro, intencionado a “abraçar com arte aquela superfície da fonte”[33]. Adamo, que pode perder-se a si mesmo nas aparências e transformar-se em besta, Narciso transformado em flor no instante em que viola o véu que separa o homem da consciência de si mesmo. É uma forma trágica de liberdade que compartilham e os condena à metamorfose: ambos devem olhar sobre o abismo da consciência de si tendo como única finalidade a ordenação e a compreensão de uma realidade que sem o seu olhar não teria razão de existir.
O Adamo de Pico, criado para “apreciar, amar e admirar” todo o universo, deve ser “escultor de si mesmo” e filósofo para reunir e conectar (corrogat et counit) cada grau da realidade[34]. Espírito e natureza, mundo inteligível e mundo físico, pensamento e matéria, se “harmonizam” no homem “que tem em si o fundamento da sua paz”[35] e que pode exprimi-la na arte: “a natureza espiritual de tudo não se pode pensar em conjunto aos corpos senão como arte, que existe na mente do arquiteto, se conjuga o cimento, a madeira, as pedras”[36]. Do mesmo modo, o homem que não está “em paz consigo mesmo”, o homem dilacerado na divisão entre corpo e espírito – arrastado na carne como o “bruto” da Oratio – destrói si mesmo e à harmonia que é chamado a realizar. O pecado, a violação da ordem, o prejuízo do homem ao realizar-se – como ponto de síntese entre mundo intangível e mundo físico – não acerta apenas o homem: no momento em que o homem rompe a relação com a qual compreende em si todos os graus da realidade, a ordem mesma da natureza é violada: “nos livros dos profetas – escreve Pico – quando se reporta um comando ou um veto de Deus, se invocam ao testemunho o céu e a terra, porque, a violação da lei ofende a eles também”[37].
Através do homem, o mundo sensível comunica e se funde com aquele intangível, a realidade corpórea percebida com os sentidos, reordenada pela razão e reformada pela imaginação, reflete na forma pura da ideia no intelecto humano[38]. Do mesmo modo, a ideia abstrata ganha consistência e objetividade na obra de arte na qual a ideia artística se exprime. Esta fusão entre natureza e espírito se realiza por obra do homem somente se o homem escolhe usar a própria liberdade para realizar completamente si mesmo. O homem que opta por ser como uma besta ou como um vegetal, por renunciar à plena humanidade, por limitar-se a exprimir somente aquilo que o une aos animais ou às plantas rompe a ordem natural das coisas e interrompe aquela fusão entre espírito e matéria sobre a qual se funda a harmonia de tudo e a beleza do cosmo. Por isto não apenas Deus, mas a natureza e os céus devem vingar-se dele, perseguindo-o e constrangendo-o a viver “como aqueles que rondam em torno da terra e do mar e sempre acabam punidos do açoite divino. Estes fulminam e perseguem o céu, estes a terra, estes toda a inquebrável justiça da Cidade universal”[39]. Ao examinar bem, a situação do pecador em Pico não é muito diversa da condição humana descrita no Theogenius: o homem é “inimigo capital daquilo que vê e daquilo que não vê, tudo o que quis a servidão; inimigo da geração humana, inimigo de si mesmo”[40].
“Nenhum vínculo do mundo – escreveu Eugenio Garin – mas ofensas e dores do mundo, o homem exprime o absurdo e a loucura da vida”[41], uma loucura gerada da inconsciência de quem “quis sulcar o mar e ir, creio, para fora do mundo; quis andar sob a água, embaixo da terra, dentro dos montes pregar cada coisa, e esforçou-se por andar sobre as nuvens”[42]. O homem do Theogenius é inimigo de si mesmo e da natureza na medida em que é “o signo de uma ruptura do ser”[43], a mesma a quem constitutivamente é exposto o “grande milagre” de Pico, com uma diferença radical pois: em Pico a liberdade humana é a brecha que sempre faz passar um pouco de luz sobre a tragédia da existência humana, em Alberti do Theogenius, do Momus e das Intercenali, ao invés, a dureza do destino humano parece fechar cada espaço de salvação.
4. Recomposição da ordem
Como escreveu Eugenio Garin, “destruída a mediação humana entre um céu desprovido de deus e um mundo vazio de qualquer intervenção providencial, restituída à sua miséria real o mortal deus feliz, que coisa resta senão o absurdo de forças cegas, de formas sem rumo, de eventos privados de sentido?” [44] Talvez reste qualquer coisa. Resta o sentido das operações provisórias do arquiteto, pois justamente porque consciente do fato de que o homem é “quase sombra de um sonho” e a vida humana uma “brincadeira da Natureza” [45], ele deve buscar agir em vista “do menor dano ou da máxima utilidade possível” [46]. Resta o saber do artífice, que mais do que o filósofo pode conhecer e representar a realidade na sua loucura e efemeridade[47]. Resta, enfim, a importância da busca da virtude, que mesmo nas páginas mais sombrias de Alberti permanece como a única perspectiva de sentido possível. A recomposição da ordem natural das coisas, lacerada que seja em Pico e em Alberti, da hybris e da baixeza do homem, depende em última análise justamente da possibilidade de um percurso moral que forma o homem em sua inteireza. O exercício da virtude é, assim, o único caminho possível para recompor a fratura aberta entre o homem e ele mesmo e entre o homem e a natureza.
Na Intercoenale intitulada Fatum et fortuna[48], Leon Battista Alberti recapitula em forma poética a própria concepção da vida e do homem. Do alto de uma “altíssima montanha”, circundada por um rio “excepcionalmente rápido e cheio de vórtices”, descem “inumeráveis multidões de sombras”[49], “centelhas de fogo celeste […] destinadas a tornar-se homens”[50]. O nome do rio é “Vida e Tempo”[51], e as sombras devem atravessá-lo buscando evitar os penhascos e os perigos. A sua viagem termina apenas quando todas as almas são carregadas pelo rio que representa a morte. Certas sombras tentam atravessar o rio a bordo de cabaças e à primeira vista parecem ser mais afortunadas do que aquelas que sem ter nada tentam percorrer o rio a nado. Na realidade, essas cabaças “sopradas de esplendor e pompa”[52] são riquezas completamente inúteis e destinadas a ficar em pedaços no primeiro penhasco. Mais afortunadas são as sombras que, sem possuir nenhuma riqueza, são obrigadas a aprender a nadar sozinhas. Também os Deuses voltam seu afeto e benevolência a elas porque são aquelas as almas mais “industriosas” e “ativas”. Os impérios e as cidades são representados por barcos muito mais seguros, mas nunca fortes o bastante para suportar o impacto com os penhascos mais perigosos. Os magnânimos e os bons cuidam da própria nave e essas almas “preferem sempre uma nave muito pequena a uma prancha privada”[53], mas também as melhores naves são destinadas a afundar. Para Alberti, de fato, qualquer ordem social e política é sempre muito frágil para resistir aos perigos do tempo e da fortuna. Na navegação, todos são impedidos por aqueles que, incapazes de nadar, buscam continuamente impedir que os outros o façam, os invejosos. Os avaros, por sua vez, restam prisioneiros da lama buscando roubar aqui um barril, ali uma mesa. Apenas os mais sábios atravessam o rio a bordo de pequenas mesas que representam as artes: aqui Alberti não se refere apenas aos grandes homens que criaram a própria mesa (os fundadores de uma disciplina ou de uma arte), mas também a quem as fez crescer, aperfeiçoando um campo de saber, a quem conseguiu salvar uma dessas mesas dos penhascos e do esquecimento e, enfim, a quem conseguiu construir “por analogia” novas mesas para oferecer a outros navegantes.
A narrativa poética de Alberti se fecha na definição de Fato, entendido como “o curso das coisas na vida humana, que transcorre segundo uma ordem própria”[54], e da Fortuna, que sendo mais ou menos ágil resta de certo modo nas mãos do homem[55]: cada homem, de fato, renunciando às riquezas vãs e refutando o vício, pode escolher aprender a nadar sozinho, não tanto para obter a benevolência dos deuses, mas, ainda melhor, para receber a estima dos homens justos. Nesta intercoenale de Alberti, a dialética liberdade-necessidade se articula em uma reflexão a respeito do destino consciente dos impedimentos que impedem o agir livre do homem, mas aberta à possibilidade de um caminho ético que premia os sábios. A reflexão albertiana sobre a relação entre vida ativa e vida contemplativa articula-se atribuindo a essas duas perspectivas espaços e razões diferentes: ambas têm fundamento em uma dimensão totalmente humana. O homem pode legitimamente abandonar-se à contemplação, na medida em que é lícito tender à serenidade e à paz. Quem escolhe esta via, entretanto, não busca a visão beata de deus, mas quer apenas evitar os tormentos ligados à vida política: a sua virtude consiste no servir de modo diverso à coletividade, acrescentando, por exemplo, o saber no campo das artes e das ciências. Em Alberti, escolhem-se as aporias inerentes à dialética entre liberdade e necessidade porque estão colocadas no plano de interesses comuns, em uma dimensão prática em que o espaço do agir humano coincide com o dever de fazer florescer as melhores obras humanas na plena consciência de sua efemeridade. É precisamente nesse espaço que o homem pode operar sem opor-se ao destino e à natureza, aceitando a ordem e as leis sem resignar-se, mas também sem tentar inutilmente infringi-las, e assim pode navegar sobre o rio da vida e do tempo e criar, salvar e acrescentar um saber totalmente humano que na virtude se realiza como síntese de pensamento e natureza. Consciente da perfeição da natureza, da sua ordem e das suas leis, o artífice busca não violentá-la, mas sim operar em harmonia com seu curso. É assim que na criação artística, por um instante, pensamento humano e natureza se harmonizam, compenetrando-se em uma obra que tem toda a fragilidade de uma coisa criada por uma sombra de sonho, mas que tem junto de si o esplendor da plena realização do pensamento humano.
A imagem perfeita dos riscos da condição humana em Pico é aquela “daqueles que giram em torno da terra e do mar e sempre são punidos pela esfera divina”[56], mas a ideia de liberdade absoluta tem também uma oura face, de outro modo trágica, mas salvífica: junto às baixezas que transformam o homem em uma besta, existe a escolha livre do sábio que tende à verdade através de um percurso teorético e moral: teorético porque parte de uma pergunta sobre os modos do conhecimento humano e desenvolve-se na formulação de uma ordem diversa de saberes; moral porque é em torno da ideia de homem e virtude que Pico constrói sua concordia philosophorum, e fá-la a partir de uma ideia de filosofia entendida como a única atividade na qual o homem se realiza. Para Pico, a busca da verdade coincide com aquela do bem e do belo, e termina na superação da dialética entre sujeito e objeto: o filósofo indaga com a filosofia natural a natureza que o circunda, domina os instintos de sua própria natureza com a filosofia moral e, ao fim, descobre em si como um seu produto a beleza da ordem das coisas. O aperfeiçoamento ético do homem e o conhecimento da natureza pressupõem a empresa: o ponto fundamental, entretanto, é que apenas na filosofia os dois aspectos se juntam. O filósofo compreende como objeto de seu pensamento o próprio pensamento e o processo de reformulação conceitual através do qual ele reformou a realidade externa, transformando o sensível em ideia, o particular em universal, o objeto externo em conceito[57]. Por isso, o homem que se permite apenas seus apetites, o bruto ou o vegetal da Oratio representa uma fratura entre o mundo sensível e aquele inteligível, enquanto o filósofo é união e síntese dos dois mundos, o nó através do qual natureza e pensamento comunicam-se e fundem-se.
É na Oratio que Pico descreve o itinerário moral e cognoscitivo que conduz o homem à realização de si mesmo na filosofia: “emulando na terra a vida querubínica – escreve Pico, “refreando o ímpeto das paixões com a ciência moral, dissipando a treva da razão com a dialética, purifiquemos a alma limpando-a das sujidades da ignorância e do vício para que os afetos não se desencadeiem cegamente nem a razão imprudente alguma vezes delire. Na alma, portanto, assim recomposta e purificada, difundamos a luz da filosofia natural, levando-a em seguida à perfeição final mediante o conhecimento das coisas divinas”[58]. Em primeiro lugar, o homem deve aprender a dominar a si mesmo, é essa a premissa necessária a qualquer outro tipo de conhecimento. A virtude é o domínio do homem sobre si mesmo, e é o pensamento que se impõe sobre o corpo e transcende o instinto natural na obediência à lei moral. O conhecimento da natureza depende desta premissa primeira e fundamental: apenas a alma “composta e purificada” pela moral, a alma que impôs a própria lei a si mesma, pode cumprir a mesma operação no confronto com a natureza externa. Conhecimento, domínio de si e investigação da natureza são possíveis, entretanto, apenas através da dialética, através de um saber que coincide com o próprio desenvolvimento da filosofia. A dialética em Pico serve para “dissipar a treva da razão”, é método de análise, obra de esclarecimento conceitual sem o qual o processo através do qual o pensamento reformula a própria natureza do homem e aquilo que o circunda não teria sentido. Sem o uso correto da razão, o pensamento está destinado ao delírio e à loucura das paixões, e por isso a outra face da liberdade quase heroica que permite ao homem escolher o caminho do conhecimento é a amarga consciência das feridas, dos vícios e das dúvidas que caracterizam a vida humana. A filosofia, por um lado, é a cura e o bálsamo para tudo isso, mas, por outro lado, ela se explica e encontra o próprio limite no estado conflituoso que caracteriza o mundo e a natureza. E é justamente nesse contexto que volta novamente em Pico a ideia de natureza como conflito, sempre em referência a Homero e Heráclito: “A dialética acalmará a razão tumultuosamente mortificada entre os contrastes das palavras e dos silogismos capciosos. A filosofia natural acalmará os conflitos da opinião e os dissídios que atormentam, dividem e dilaceram de modos diversos a alma inquieta. Mas acalmá-los-á de modo a recordar-nos que a natureza, como disse Heráclito, é gerada da guerra e, por isso, chamada por Homero de luta”[59].
A partir dessa contraposição entre a busca inquieta que caracteriza a filosofia e a “paz estável” da teologia, torna-se possível compreender a tensão moral que Pico coloca como a verdadeira tarefa do filósofo. Em primeiro lugar, a filosofia se exercita no confronto de homens entre homens, na dimensão pública da disputa, e ela tem o direito de trazer ao embate das opiniões humanas “Deus, a natureza e a moral”: o embate e o conflito animam a busca filosófica e, sem verdadeiras discussões humanas, cada filosofia seria apenas – escreve Pico – “torpemente sonhadora”[60]. Em segundo lugar, Pico distingue claramente o espaço da razão filosófica e aquele da fé: tratam-se de duas dimensões separadas, sujeitas a lógicas diferentes. A filosofia se ocupa do provável e das opiniões humanas, a fé, das verdades indiscutíveis, admitindo-se que existem. Somente distinguindo-as é possível reconhecer a importância de ambas. Caso contrário, não existe filosofia e a própria fé vacila. A tarefa do filósofo é aquela de desvelar contradições, reencontrar significados e entrar diretamente na palavra, mas trata-se de uma busca que mantém em si toda a tragicidade do operar sempre provisório e fugidio do arquiteto de Alberti. “Ridícula e sacrílega” – escreve Pico – “é a nossa temeridade que reivindica o juízo sobre a ordem universal, sobre a sabedoria divina que estende o olho da providência e o raio de sua bondade, mas não à utilidade de um só homem, de uma só família, de uma só cidade, mas àquela de todo o mundo, e não por um século, mas por todos os séculos”[61]. O tempo é novamente o elemento que condena o homem a um saber e a um agir irremediavelmente frágeis. A ordem de todas as coisas, o sentido da história, o porquê das mudanças e do devir: tudo isso ocorre segundo tempos incompreensíveis ao homem. O filósofo de Pico, exatamente como o arquiteto de Alberti, bem sabe que não faria sentido opor-se ao contínuo curso da natureza, pensar poder definir o sentido e buscar fixar de uma vez por todas as razões e as leis. A ambos resta, entretanto, o espaço de um dia, um lapso de tempo finito no qual pode transformar a loucura das próprias paixões em virtude, o desconhecido movimento das estrelas em conjeturas, os fantasmas da natureza em produtos do pensamento. Criatura de um dia, sombria e frágil, na consciência de seu ser finito, o homem descobre uma perspectiva sobre o infinito: a partir da própria fraqueza e temporalidade, pode libertar-se do dogma e da aparência, pode abrir-se finalmente à dignidade do caminho moral em direção à sabedoria na qual realiza-se finalmente como harmonia e síntese de pensamento e natureza.
* Pesquisa realizada graças a uma bolsa de pós-doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
[2] E. Garin, Studi su Leon Battista Alberti, in Rinascite e Rivoluzioni, Laterza, Roma-Bari 1975, p. 145.
[3] A. Angelini, L’architettura come “umbra d’un sogno”, in Il pensiero simbolico nella prima età moderna, a cura di A. Angelini e P. Caye, Olschki, Firenze 2007, p 64.
[4] Carlos Brandão, O filosofo e o pintor: humanismo e anti-humanismo em Leon Battista Alberti, in O que nos faz pensar, Cadernos do Departamento de Filosofia da PUC-Rio, n. 27, maio de 2010, p. 150.
[5] E. Garin, Il pensiero di Leon Battista Alberti: caratteri e contrasti, in Leon Battista Alberti. Studi nel V Centenario della morte, Sansoni, Firenze 1972, p. 16. Cfr. A. Angelini, L’architettura come “umbra d’un sogno”, cit., 61.
[6] Giovanni Pico della Mirandola, Disputationes adversus astrologiam divinatricem, a cura di E. Garin, voll. 2, Olschki, Firenze, 1946 e 1952, p. 444.
[7] E. Garin, Studi su Leon Battista Alberti, in Rinascite e Rivoluzioni, cit., p. 153.
[8] L.B. Alberti, De re aedificatoria libri decem, a cura di G. Orlandi e P. Portoghesi, Il Polifilo, Milano 1989, p. 101. Cfr. A. Angelini, L’architettura come “umbra d’un sogno”, cit., p. 60.
[9] L.B. Alberti, Momo o del Principe, a cura di Rino Consolo, Edizioni Costa e Nolan, Genova 1986, p. 76.
[10] Ibidem.
[11] Ibidem.
[12] L.B. Alberti, De Iciarchia, Edizioni La Biblioteca Digitale, Libro III.
[13] Ibidem.
[14] Ivi, Libro I: «Con questa cupidità di sapere se la natura non avesse immesso all’omo lo’ngegno attissimo ad imparare, arebbe errato. Qual cosa chi dicesse errerebbe lui. Mai in cosa niuna la natura per sé mai errò, mai errerà». Sobre o porquê a natureza concedeu a palavra aos homens, Alberti escreve: «Circa le parole accade referire più cose molto utili e molto necessarie. Pigliaremo, a questa recitazione, da’ principi della natura. Noi vediamo comune agli altri animali le voci loro date dalla natura a qualche fine, con qualche cagione. Sarebbe iniuria se alle bestie lo esplicare e’ concetti loro fusse concesso con più ragione che all’omo. El cane, dicono, abaia per fame, urla per desiderio, ringhia per ira, mugola per amore. Non è da credere che in noi siano le parole senza ragione e fine ottimo, quanto siamo differenti e superiori al resto di tutti gli altri animali. El favellare per sua natura mostra l’ordine delle cose passate, e rende la ragione delle presenti; e dicesi che egli è vinculo della società fra gli omini, dimandando per imparare e dicendo per esplicare insieme quello che bisogni loro a bene e beato vivere» (Libro II). Mas sobre a linguagem como dom da natureza, cf. Theogenius, libro I «e quello che la natura propio e divino suo dono atribuì a’ mortali per agiungerli a cara insieme benivolenza e dolce pace, el favellare, lo uomo pessimo l’adopera in disturbare qualunque grata congiunzione e offirmata grazia».
[15] L.B. Alberti, De Iciarchia, Libro I: «non dede la natura all’omo tanta prestanza d’ingegno, intelletto e ragione perché e’ marcisse in ozio e desidia. Nacque l’omo per essere utile a sé, e non meno agli altri. La prima e propria utilità nostra sarà adoperar le forze dell’animo nostro a virtù, a riconoscere le ragioni e ordine delle cose, e indi venerare e temere Dio».
[16] L.B. Alberti, Theogenius, Edizioni La Biblioteca Digitale, Libro I.
[17] Sobre a leitura de Giordano Bruno destas páginas do Momo, cf. E. Garin, Studi su Leon Battista Alberti, cit., p. 140-141.
[18] G. Pico, Heptaplus, in De hominis dignitate, Heptaplus, De Ente et Uno, a cura di E. Garin, Aragno, Torino 2004, p. 217.
[19] Ivi, p. 495.
[20] Ivi, p. 495.
[21] Ivi, p. 185.
[22] Pindaro, Pitica VIII, 92 ss.
[23] G. Pico, De hominis dignitate, Heptaplus, De Ente et Uno, cit., p. 481
[24] L.B. Alberti, Theogenius, cit., Libro II.
[25] G. Pico, Disputationes adversus astrologiam divinatricem, cit., vol. I, p. 103.
[26] Este também é o sentido do parágrafo 18 do De pictura, no qual Alberti trata da comperazione. Não existe uma realidade unívoca a representar, mas é o artista que instaura, entre os vários elementos da composição, o tipo de relação mais funcional à representação.
[27] Cfr. A. Angelini, L’architettura come “umbra d’un sogno”, cit., p. 64.
[28] «Id quod ita tractabitur a nobis, ut hoc quidem libro defendamus agere caelum in nos tantum motu et lumine; praeter haec frustra occultiores afflatus alios cogitari; tum a lumine illo siderum et motu, non aliud communicari materiae patienti quam motum, lucem et calorem» G. Pico, Disputationes adversus astrologiam divinatricem, cit., vol. I, pp. 176-178.
[29] A astrologia divinatória não se baseia nos únicos instrumentos que o homem tem à disposição para conhecer a natureza: o sentido e a razão. A astrologia não pode ser demonstrada “neque sensum neque ratione” (Ivi, p. 276) porque requereria experimentos impossíveis, “qualcosa di infinito, non riducibile né a metodo né ad arte alcuna” (Ivi, p. 464). Os argumentos dos astrólogos são errôneos porque se baseiam na experiência que não têm “nulla di congruo, di costante, di vero, di credibile, di saldo” (Ivi, p. 43), observações conduzidas sem a guia da razão “unica forza in noi innata contro l’inganno” (Ivi, p. 39) e, assim, errôneas.
[30] Ivi, vol. II, p. 227.
[31] Ivi, vol. II, p. 235.
[32]Carlos Brandão, O filósofo e o pintor: humanismo e anti-humanismo em Leon Battista Alberti, cit., p. 161.
[33] L.B. Alberti, De Pictura, Edizioni La Biblioteca Digitale, 26.
[34] G. Pico, De hominis dignitate, Heptaplus, De ente et uno e scritti vari, cit., p. 301.
[35] «Le cose terrene servono all’uomo; le cose celesti gli danno la loro assistenza, perché egli è vincolo e nodo delle cose celesti e terrene ed entrambe, purché sia in pace con se stesso, si armonizzano necessariamente con lui che ha in sé il fondamento della loro pace». G. Pico, De hominis dignitate, Heptaplus, De ente et uno e scritti vari, cit., p. 305.
[36] Ivi, p. 315.
[37] Ivi, p. 307.
[38] É Pico que usa o verbo “reformar” para indicar a atividade da imaginação, que libera o objeto do conhecimento da “deformidade” da matéria. Entretanto, sendo a imaginação uma faculdade ainda “material e orgânica”, não pode completar essa operação, que se concluirá somente na atividade puramente espiritual do intelecto: “[…] Diz o Poeta que são por ela [a imaginação] às vezes reformadas, mas não expressas, senão pela imaginativa, que, como a mais alta e mais nobre potência do sentido, faz aquela espécie mais espiritual e, consequentemente, mais a afasta da deformidade da matéria, que com ela não sofre a verdadeira Vênus, mas não pode, sendo ela pura potência ainda material e orgânica, reduzir aquela espécie à perfeita imaterialidade. Mas diz que a reforma, mas não a expressa. (Ivi, p. 577).
[39] Ivi, p. 307.
[40] L.B. Alberti, Theogenius, cit., Libro II.
[41] E. Garin, Studi su Leon Battista Alberti, cit., p. 153
[42] Ibidem
[43] Ivi, p. 178.
[44] Ivi, p. 179.
[45] L.B. Alberti, Momo o del Principe, cit., p. 76.
[46] A. Angelini, L’architettura come “umbra d’un sogno”, cit., p. 64.
[47] Cfr. Carlos Brandão, O filósofo e o pintor: humanismo e anti-humanismo em Leon Battista Alberti, cit., pp. 155 ss.
[48] Leon Battista Alberti, Intercenales, a cura di Franco Bacchelli e Luca D’Ascia, premessa di Alberto Tenenti, Edizioni Pendragon, Bologna, 2003.
[49] Ivi, p. 43
[50] Ivi, p. 44.
[51] Ivi, p. 47
[52] Ivi, pp. 46-48.
[53] Ivi, p. 50.
[54] Ivi, pp. 54-56.
[55] «Fortunam vero illis esse faciliorem animadverti, qui tum in fluvium cecidere, cum iuxta aut integre asserule aut navicula fortassis aliqua aderat. Contra vero fortunam esse duram sensi nobis, qui eo tempore in fluvium corruissemus, quo perpetuo innixu undas nando superare opus sit. Plurimum tamen in rebus humanis prudentiam et industriam valere non ignorabimus» Ivi. p. 56
[56] G. Pico, De hominis dignitate, Heptaplus, De ente et uno e scritti vari, cit., p. 307.
[57] No Commento, o processo do conhecimento humano parte dos “fantasmas” da mente, que vêm necessariamente dos sentidos, mas após são a imaginação, a razão e o intelecto a dar-lhes síntese e plasmar por abstração o objeto do conhecimento, com uma operação através da qual a mente redescobre dentro de si, e por si formada, a ordem de todas as coisas. No Commento, é a passagem do conhecimento relacionado aos sentidos àquele puramente intelectual o momento em que a mente descobre a si mesma, após ter purificado com a imaginação e a razão o objeto que antes estava em frente: “Nesta cognição universal, a alma se deleita nas coisas por ela fabricadas, e nela o lume da verdadeira beleza, como o lume de sol embaixo da água, vê.” (Ivi, p. 579).
[58] Pico della Mirandola, Discurso sobre a dignidade do Homem, tradução e apresentação de Maria de Lourdes Sirgado Ganho, Edições 70, Lisboa 2011, p. 65.
[59] Ivi, p. 69.
[60] Pico della Mirandola, De hominis dignitate, Heptaplus, De ente et uno e scritti vari, cit., p. 137.
[61] G. Pico, Disputationes adversus astrologiam divinatricem, cit., p. 445.
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