Da fome contínua à boca discreta: teorias afro-brasileiras da criação
EVENTO ///
RESUMO //
Edgar Barbosa Neto, antropólogo /
O sistema mitológico e ritual de algumas das várias formas assumidas pelas religiões afro-brasileiras compõe-se, em ampla medida, de um conjunto de variações acerca do tema da ‘boca’, aqui entendida tanto no seu aspecto culinário (‘a boca que come’) quanto discursivo (‘a boca que fala’). É o que podemos ver, por exemplo, com um dos mitos de criação do mundo. Movido por uma fome incontrolável, Exu, orixá que neste mito aparece como o primogênito da criação, põe-se a devorar o mundo. Convencido por seu pai, ele, no entanto, inverte o movimento de ingestão, restituindo com isso a existência. A criação, neste caso, aparece principalmente como uma recriação, o efeito resultante de uma espécie de ‘regurgitação cósmica’ de um deus cuja posição no panteão é objeto de ampla controvérsia. O objetivo desta comunicação é aprofundar este exemplo por meio de suas relações com outros mitos e com o próprio sistema ritual, investindo na descrição de algumas de suas delicadas maneiras de falar e de comer.