Giordano Bruno, universo infinito e finitude humana
Concepções cosmológicas estão profundamente ligadas ao modo como compreendemos o universo, a natureza, a vida e o ser humano. Não há cultura que não tenha produzido, ao seu tempo e em seu contexto histórico e social, uma imagem de mundo baseada na interpretação do cosmos. Representações artísticas, narrativas míticas, reflexões filosóficas e explicações científicas servem para mostrar a presença marcante da cosmologia, em suas mais variadas formas de interpretação. Por isso, também não se pode deixar de reconhecer que as concepções cosmológicas constituem o horizonte interpretativo sobre o qual incidem perguntas imprescindíveis para compreender a própria experiência do pensar e do agir humano.
Embora as perguntas sobre o cosmos tenham uma longa história, não resta dúvida de que foi em torno da cosmologia e da filosofia da natureza que foram sendo forjadas as bases do projeto moderno, instituído com o advento da moderna mentalidade científica associada à transformação histórico-conceitual produzida pelo movimento intelectual ao qual costumamos chamar de Renascimento. Isso é especialmente significativo quando se considera o contexto da revolução copernicana, para a qual Nicolau de Cusa e Giordano Bruno, dentre outros, ofereceram argumentos metafísicos e matemáticos decisivos para os debates acerca da unidade, da infinitude e da eternidade do universo.
Mas, ao propor a substituição do modelo de um mundo fechado para o modelo de um universo infinito com uma pluralidade de mundos, teria a grande mudança conceitual operada pela revolução copernicana também transformado o modo de compreender o próprio homem? As reflexões de Maquiavel e Montaigne, por exemplo, parecem indicar claramente uma íntima conexão entre cosmologia e filosofia moral, natureza e política. No caso de Maquiavel, o movimento do mundo celeste, eterno e circular, contrapõe-se às contínuas transformações do mundo sublunar, onde tudo é instável e está sujeito à corrupção e à mudança. Mas, não raras vezes, o próprio modelo da cidade ideal busca inspiração na representação idealizada do cosmos, como em Leonardo Bruni. Por isso, pode-se justificar que, para o pensamento renascentista, conflito e harmonia ora são contrapostos, ora se complementam; que a ordem do cosmos guarda uma relação direta, às vezes de valência inversa, com a liberdade humana, como bem o mostram pensadores como Giovani Pico della Mirandola e Leon Battista Alberti.
Essa teia de interações entre cosmologia, filosofia, ética e natureza, que tem lugar em um contexto de transformação impulsionado pelo movimento renascentista, assim como as contribuições de vários autores para a análise do modelo emergente de compreensão do universo, encontram repercussão nas palestras dos especialistas de diversos campos do conhecimento que integram este seminário.